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18.1.07

Amanhã um dia

A cada linha que leio penso nela. Onde andará a menina cuja mãe adoptiva decidiu levar não sei para onde? Será que vai à escola? Será que tem amigos? Quem foi à sua festa de aniversário? Andará a saltar de casa em casa, de quarto em quarto, sem rotinas, sem segurança, a viver no medo? Que mãe é a que a aconchega à noite, que condições terá para a confortar, para lhe transmitir palavras de serenidade, de conforto, de segurança? O que lhe dirá sobre amanhã? Vai poder ir ao escorrega? Será que carrega os filmes de um lado para o outro? Será que canta as mesmas músicas? Será que pergunta pelos amigos da escola e quando os vai ver? Que respostas conseguirá obter? Deverá ouvir da boca da mãe, como se de uma criança de dois anos se tratasse, ainda sem noção do passado e do futuro, «amanhã um dia...»

«"Amanhã um dia" podes voltar à escola, ter o teu quarto, ver os teus brinquedos, ter um bolo pelos anos com todos os teus amigos à tua volta, fazeres vezes sem conta as mesmas coisas pela mesma ordem, contar ao jantar como foi o teu dia e falar dos nomes das pessoas que sempre encontras e que fazem parte do teu quotidiano.»

Parece-me errada aquela prisão, mas não consigo ficar assim tão chocada com o que supostamente é uma injustiça. Porque estes pais adoptivos e este pai biológico foram injustos primeiro. Muito antes de os tribunais o serem.

Os pais adoptivos foram injustos quando proibiram o pai biológico de ver a criança, quando ela tinha apenas 20 meses, e de tentar estabelecer com ela uma relação. Foram injustos quando se negaram a dar-lhe uma fotografia. E o pai biológico, retribui agora com a mesma moeda. Se ficar com a criança nunca mais vai deixar que ela veja os pais adoptivos.

Tanto uns como outro não têm respeitado o que acima de tudo havia a respeitar. A própria criança. Ela é um objecto, uma coisa que lhes desperta um sentimento de posse como se de um carro ou uma casa se tratasse. Ela é objecto de vinganças e de lutas e de processos e de debates.

Cada vez tenho mais dúvidas é que ela seja o que sempre deveria ter tido direito a ser: uma criança.