lista de compras: dezembro 2005

30.12.05

Ginga



Finalmente consegui ver na totalidade o documentário GINGA, de Fernando Meirelles (sim outra vez), que a Sic Notícias ora passa inteiro ora passa em manta de retalhos. É de uma sucessão de retalhos que se trata, tudo com uma bola pelo meio, uma filmagem excelente e uma montagem ainda melhor.

Há a história de Paulo César, que quer triunfar no mundo do futebol, mas é várias vezes rejeitado por não ter físico a juntar à arte que lhe sobra nos pés. Percebemos porquê. Em casa de Paulo César só há uma refeição diária e o rapaz é arrumador de carros durante a noite. É por isso que acaba a chorar no autocarro que o leva do fim do sonho de volta à favela.

Há a história de Sérgio, o paulista branco, de família abastada, que sofre os problemas da discriminação quando chega para mostrar como ginga. Com aparelho nos dentes, a pele demasiado clara e chuteiras demasiado boas, Sérgio pede para mostrar primeiro e falarem depois.

Há a história de um preto de sorriso lindo que ginga com uma perna só. Como não tinha um real para entrar no café que passava o jogo do Flamengo no cabo, teve de ficar na rua a ouvir apenas o que se passava no campo. Foi aí que um carro o atropelou. Joga agora com uma perna e duas muletas.

Há a história de uma equipa de futebol que treina na praia, dentro do mar, a puxar bois e que viaja oito horas rio acima para disputar um torneio estadual.

Há quatro morenas que jogam futvólei na praia.

Há dezenas de miúdos que gingam com uma bola tal e qual vemos nos anúncios do Ronaldinho.

Há imagens de Robinho, na altura ainda estava no Santos, a jogar num pavilhão com seis ou sete anos. Há o Robinho estrela, de óculos e camiseta de marca. Um dos Paulos Césares que conseguiu chegar ao estrelato.

Há futebol.

28.12.05

Também eu, também eu...

Declaração de voto

Ele diz que as eleições não são como o amor. Que não é preciso gostarmos da pessoa. Mas o que temo é que estas eleições sejam como o sexo. E eu não quero acordar arrependido na manhã seguinte.

27.12.05

Não só a sabedoria, mas principalmente a sensatez...

Maria (7 anos) - Olha, esta música que se ouve é a dos Morangos com Açúcar?

Rita - Não sei Maria, não conheço as músicas.... Como é que é? Canta lá....

Maria - Nãaao...

Rita - Vá lá, canta um bocadinho, não sabes a letra?

Maria - Tem palavras muito difíceis... Por isso é que canto cá no meu pensamento, porque se abro a boca sai tudo mal...

22.12.05

E o primeiro prémio vai para...





Fernando Meirelles.

O troglodita que escreveu no Público que o homem não passava de um realizador de publicidade quando fez o brilhante Cidade de Deus dirá o quê depois deste maravilhoso O Fiel Jardineiro?

19.12.05

Mas já que é Natal, e para não dizerem que eu tenho mau feitio....





Se quiserem, ponham-lhes um gorrozito que é capaz de estar frio...

É Natal, hã, hã...

Ando aqui há dias a matutar que devia escrever alguma coisa sobre o Natal, e tal, ou dar prendas, ou fazer listas de coisas que quero (fazendo jus ao nome aqui do tasco), ou então dar prémios, ou candidatar-me a eles (alguém sabe onde andam os formulários?), ou sei lá, falar das festas e dos jantares de Natal a que faltei porque não tenho paciência mas olha, até me calhou uma viagenzita e assim safei-me das estuchas dos repastos de empresa com gajas a pavonearem-se, velhos bêbados e canções românticas como BSO.

Em vez disso fui até à Suíça, país mais-que-civilizado, houve neve, trabalho, chatice com o troglodita que me calha sempre na rifa, raclette, charbonnade, chocolates, muita coca-cola, um gorro lindo de morrer, horas de espera no aeroporto, dizer mais uma vez que não, quero lá saber disso da pátria, mas por que raio, sim, portuguesa no passaporte, mas se não fosse e se tivesse de mudar para viver melhor, what the heck, fazia-o sem pestanejar, mas como é possível?, é possível, é....

Quero lá saber disso da pátria, que se foda quem maltrata as crianças, quem fecha os olhos para o vizinho que bate na mulher, que acha lindo que o outro do lado fuja aos impostos e queira saber como se faz, que se queixe da vida e compre 30 telemóveis por ano, que gaste rios de dinheiro para viver num t3 em massamá e depois grite com toda a gente porque está horas nas bichas. Que se foda a pátria que deixou o Samuel vir bater à minha porta sem caderno nem lápis para entrar na escola, que não deixa que um homem durma descansado no seu buraco do eixo norte-sul, que não diga nada à mulher da esquina que guarda atrás dela uma pilha de caixas de telepizza à espera de um dia ter família com quem as partilhar. Que se foda este país de doutores e senhores engenheiros e gentinha jet set e Lilis Caneças e Cinhas Jardins que não têm onde cair mortas, um país onde um senhor qualquer é rei, mais a sua prole, um país que está prestes a eleger o Cavaco Silva porque sim, porque o homem é que vai endireitar isto. Que se foda este rectângulo de gente pouco civilizada, mesquinha, pobre de espírito, cérebro de galinha, onde ninguém tem culpa de nada e a Câmara tem culpa de tudo.

Para mim, o mundo é como o Natal. Dia 25 de Dezembro é para todos. Infelizmente não há passaporte que diga isso.

13.12.05

VOU AQUI.....







.... mas já volto.

PS: só se aceitam encomendas de chocolates.

9.12.05

Relato de uma vitória pouco aguardada

O lanche estava marcado há uns dias e sem bilhetes para ir ao Estádio da Luz ver o jogo não me restava outra solução senão a têvê.

O marido de folga vai buscar o filhote à creche, eu saio do trabalho a tempo do lanche com as duas miúdas que não vejo há meses e depois chego a casa, o Jaime janta antes do jogo e é só convencê-lo a não querer ver os Tweenies durante 105 minutos seguidos.

E..... começa o jogo!

Rita sai do trabalho às 17 horas depois de meia hora a telefonar para as duas gajas e sem saber onde é o lanche. Más notícias, o repasto é no Bairro Alto, numa casa de chá.

Seeeeegue via Monsanto, Duarte Pacheco ok e traaaaaaaaaava, na passagem das Amoreiras. Quinze minutos até ao Largo do Rato, vaca da gaja que está à frente deixa um penetra meter-se e o sinal cai. Vermelho. Vermelho. Agora não, agora não dá jeito.

Cai. Rua da Escola Politécnica ok. Estaciona no Camões e entra na casa de chá às 17h35.

Blá, blá, blá, trequebeque, trequebeque, muita fofoca, ai é? e o coiso, onde é que anda? ahhh, não sabia, mas vais mesmo e a casa?

Olha para o relógio. O glorioso já deve estar a aquecer. Ora bolas. O scone era maçudo comó raio e o estômago está pesado.

- Desculpem, tenho de ir.

19h00 entra no carro. Regressa por onde? Ok, Av. da República. Bolas, Bicha nos túneis.

O Helder já está a dar as primeiras sobre o Estádio. Cheio. O nervoso miudinho aumenta.

Chego a casa a bola já rola. Jaime janta e quer que seja eu a dar o jantar. De repente, saio da sala por dois segundos e vou à cozinha. Volto. Olho para a têvê. 0-1. 0-1????? Foda-se, digo mentalmente, já que há uma criança nas imediações. Já estão a ganhar. Merda. merda.

Marido substitui-me na parte dos douradinhos. Sento-me no sofá. Fruta já está.

Mãe!!!!!! A piquesa!!! (nota do tradutor - quero ver o Shrek). Não pode ser, Jaime. Olha, o Shrek também está a ver o Benfica.

- Galo?

- Sim, o galo também....

- Ié, ié? (nota: Da Weasel)

- Sim, o Ié, ié também gosta muito do Benfica...


E GOOOOOOOOOOLLOOOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!! Soneca Geovanni!!!!!!!!!!!! Lindo!!!!!!!!!
Rita grita e salta. Jaime olha atordoado e salta também. Marido sorri....

Vamos lá, agora é que é!

Jaime precisa de mudar a fralda. Marido vai, ao denotar o crescente nervosismo e à forma como a gaja anda de um lado para o outro na sala. Nova ida à cozinha.

Olha, olha, olha..... Beto! Beto! GOOOOOOOOOLOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!!!! Já só vê a repetição. Os festejos são menos efusivos.

Intervalo. Jaime mais calmo, só pediu mais trinta vezes para ver tudo o que é dvd.

Segunda parte infernal. Entre os livros dos DVD do Shrek, Incríveis, Nemo, Da Weasel e Sérgio Godinho, cantar músicas repetidamente, entre ais e uuuiisss, caraças, porra (olha o puto, não digas asneiras). 45 minutos infernais.

Olha, olha, o Ronaldo. Olha, camelo. Ganda estúpido! E eu que comprei a camisola e tudo. Renegado. Riscado da lista. Puto parvo.

Vai anda, ai Koeman, ai, ai, Mantorras, meu passa a bola, caraças, passa a bola!!!!

- Não digas caraças....
- Ai, merda.... (bolas, não digas merda)

Quatro de compensação. Quatro? Porra, pá, o Quim já não está bem. Não digas porra.

três.......


dois........


um......

Acaba com isso, estúpido. Acaba. ACABA!!! ACCAAAAAAAAABAAAAAAAAAA!!!!!


Apitou.

Pelo meio comemos um spaggeti carbonara. Não me perguntem se estava bom. Vi depois que o queijo estava fora da validade. Mas não nos fez mal.

O Jaime adormeceu antes de as buzinas passarem.


- E o que é que achas?

- Eh, pá, tudo menos italianos. Italianos é que não.

- E o Barcelona também não, pá!

- Arsenal. O melhor é o Arsenal.

- Tás doido? Liverpool é o melhor.

- Cinco vitórias consecutivas.

- Ai é? E o Lyon? Jogam muito, não é?

- Hum, hum....

Tá bem. Os oitavos já não é mau.....

8.12.05

Ah, ah!!!!

Nenhum template me vencerá!

(e apesar de já ter entrado nos meus skinny jeans também não pensem que tenho o corpinho da gaja aqui do lado....)

OK, ACHO QUE JÁ ESTÁ. VAMOS LÁ VER....

OLÉ, OLÉ, OLÉ, OLÉ, OLÉ, OLÉ, OLÉ, OLÉ!!!!!

MANCHESTER QUÊ????

TOMA LÁ Ó FERGUSSON!!! E TOMA LÁ Ó RONALDO, QUE É PARA NÃO SERES PUTO ARMADO AOS CUCOS!!!!!


GANHÁMOS, CARAGO, GANHÁMOS!!!!!!

7.12.05

ORA BOLAS!!!! MAS SEM ACENTOS.....

Mas quem me mandou armar em parva? Nem sequer sou parecida com a boneca laroca daqui do lado nem nada... Acho mesmo que a boneca se torna demasiado bonequinha para a filosofia deste blogue. Mas pronto, queria mudar.

Diriam alguns que, de facto, eu tenho pontaria para escolhas desacertadas....

Mas, diria, eu, se conseguir escrever sempre textos com palavras sem acentos, tal como este, nem se nota nada.

Bom, vou tomar uma bebida que na linguagem inglesa se chama tea para ver se acalmo os nervos.

Com tanto azar aos blogues, o glorioso vai ter de ganhar....


1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10.......

Inspira.....

Expira.....

#F&+$%&u)(/)/%$#%#/%#/%#

é esta a linguagem que entendes, template dum corno?

Agora é que fiz merda, não foi?

O que é que aconteceu aos textos? Ai, ai, ai...

Alguém me explica...

... por que raio estou eu tão nervosa e, direi mesmo, esperançada, se qualquer pessoa no seu perfeito juízo daria o jogo desta noite como perdido à partida?

Porque vejamos, era bem mais sensato ir beber um copo, jantar um sushi sem televisão por perto, ouvir uma boa música e esquecer-me de que estão onze gajos vestidos de vermelho a tentar marcar um golo e a tentar não sofrer um ou mais e os outros no banco e os lesionados, caraças, nem Simão, nem Miccoli, nem Manuel Fernandes já para não falar do guarda-redes ainda meio coxo...

E depois o Nuno Gomes vai andar sozinho lá na frente e o Geovanni que não corre nada e o Mantorras depois entra mas não consegue acertar na baliza e mesmo com bons centrais o Nistelrooy e o Rooney e o Ronaldo vão partir aquela defesa toda e nem o Petit vai acertar com os livres e o Koeman vai ficar ainda mais corado e o estádio triste.

E perante isto tudo, que de facto é isto que vai acontecer, por que raio estou eu aqui sentada, ainda com esperança de arranjar um bilhete, pôr o cachecol ao pescoço e gritar até ficar com outra amigdalite pelo Glorioso, como se fôssemos ainda uma equipa de glórias além fronteiras?

Deve ser aquela coisa da paixão, sei lá.

No fundo, no fundo, dentro de mim, hoje, há um diálogo de malucos.

6.12.05

Importam-se de não repetir?

E alguém VIU um debate?

É que eu só vi uma entrevista dupla....

5.12.05

Wait, please, wait!






Quem me conhece e sofre com a minha falta de memória para datas, seja de aniversários, baptizados, casamentos e afins tem aqui a prova provadinha de que não é só com eles que acontece. Aqui a chafarica fez um ano e eu esqueci-me.

Fica aqui o post de 30 de Novembro de 2004 para assinalar a coisa, pronto.

O primeiro

E acabou aqui a minha relutância contra os malditos blogues que invadiram o nosso dia-a-dia. É blogue para cá, blogue para lá..... Também quero. E ele aqui está. Começa assim a minha lista de compras:

- Blogue

Comprado.

2.12.05

70 anos depois

Devido à amigdalite passou aqui em branco a comemoração dos 70 anos de Fernando Pessoa. Apesar de enferma e agarrada ao sofá só consegui vislumbrar uma conversa sobre o poeta na RTP 1, mas nem um poema ouvi. Por isso aqui fica um. Um dos que eu gosto. Um dos que me toca de cada vez que olho para o Jaime e nele vejo todo o sentido do Universo. E também de cada vez que rezo a um Deus que não sei de onde vem nem para onde me leva.

Poema do Menino Jesus

Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.

No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.

Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas
-Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.

Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -"Se é que ele as criou, do que duvido."
-"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres.
"E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa

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Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos às cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.
Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono

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Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é

.... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...


Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam ?

Alberto Caeiro

Bye bye Limbo!!!

Afinal este Papa tem coração. Logo de manhã na televisão oiço que o LIMBO pode desaparecer.

Diz a notícia que a IDEIA dos teólogos é a de reconhecer que todos os bebés que morram, mesmo sem terem recebido o sacramento do baptismo, irão directamente para o céu.

Ufa! Ainda bem, pá. Porque visto que as criaturas não conseguem falar para confessar os seus enormes pecados cometidos em meses ou poucos anos de vida, sei lá, um choro indecoroso, um mexer na pilinha ou no pipi, acordar durante a noite interrompendo o sono dos justos, isso de ficar no LIMBO era mau. Haja coração.

E constato outra coisa, também, interessante. É que se pode acabar com estas coisas assim de repente. Ou seja, bastava quererem, e os teólogos podiam acabar com a lógica de sofrimento, de paixão (naquele sentido da paixão de Cristo, que é o mau sentido da palavra) e de terror em que se baseiam muitos preceitos da Igreja Católica, podiam acabar com o celibato dos padres, podiam acabar com o facto de as mulheres não poderem ser sacerdotes e olhem, até podiam acabar com essa cena de não quererem gays nos seminários.

Afinal, é tudo uma questão de IDEIAS.

PS: Ainda antes da mensagem natalícia, o senhor Bento proibiu a Daniela Mercury de actuar no concerto de Natal promovido pelo Vaticano. Tudo porque a rapariga dá a cara por uma campanha a favor do uso dos preservativos. Já os Black Eyed Peas, com aquela cara de santinhos, esses, garantiram lugar cativo.

O que terá Deus a dizer disto? Limitar-se-á a abanar a cabeça?