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12.7.05

Espelho meu, espelho meu....

Fui hoje ver a exposição Espelho meu que está no CCB. Portugal no espelho. Portugal pelos olhos dos fotógrafos da Magnum. Vão, vão, vão.

Portugal 2004
Tudo começa na Cova da Moura. Susan Meiselas, fotógrafa, entrou lá de Polaroid em punho e ninguém lhe falou durante dias. Até que um rapaz lhe pediu para que ela o fotografasse. Quando viu a polaroid, quis que Susan a assinasse e pusesse o nome dele e a data.
Assim começou o Nós Kasa, uma exposição que está na Cova da Moura, o tal sítio onde taxista não entra e polícia tão pouco. Na Cova da Moura, há polaroids gigantes em estendais, em paredes grafitadas, em montras de cafés.
Há mulatas que davam capas de revista, há meninas de longos cabelos loiros, há amores de mãe, há peles que se tocam num beijo, numa dança, há crianças que brincam, há rapazes que fotografam. Há casas velhas, há lixo. Há vida.

Portugal cigano
Quatro quadros. Duas caras pintadas. Dois corpos de lantejoulas. Dois homens homens. Dignos de um filme de Kusturica.

Portugal beato
Os santinhos e as santinhas por toda a parte das casas, por detrás do anjo uma bola de futebol, ao lado do Santo António uma escova de fatos.

Portugal visto de trás
Nucas sem cabelo e carrapitos de velhinhas. Nunca se lhes vêem os olhos.

Portugal livre
A revolução de Abril. O povo nas ruas. O 1º de Maio de 75. As cooperativas. As reuniões nos ginásios. O Vasco Gonçalves.Um PIDE ensanguentado.

Portugal em documentário
Mais de 40 filmes sobre a revolução e o PREC foram feitos por estrangeiros. Não há uma única cópia deles em Portugal. Os jornalistas que os fizeram, os realizadores, os homens que vieram em massa para Portugal para registar «um país onde se vivia um sonho». Muitos vieram para partilhar o sonho, outros apenas para registar que esta nossa gente acreditava mesmo que era possível viver em comunidade, em que a enxada era da cooperativa. O registo do Portugal que tinha uma liberdade tão grande que ficou depois tão estreitinha, como diz a Custódia, de Baleizão, 30 anos depois. Já não se lavra a cantar a catarina Eufémia, já não se deslumbram as pessoas ao entrar na Torre Bela e a experimentar as roupas dos ricos. Baleizão já não tem gente na rua ao Domingo. Um dos repórteres diz que chorou quando editou as imagens do pós-revolução com a música do José Mário Branco de fundo: «Foi um sonho lindo que acabou....» Como é possível que tanta gente tenha acreditado que era possível?

Portugal nazi
Nos anos 60 um rapaz da Mocidade Portuguesa faz a saudação nazi. Salazar impera. As caras são tristes. Os penteados rígidos.

Portugal triste e católico
Nos anos 50, dois noivos esperam sentados a uma mesa os convidados que parecem nunca terem chegado. Uma procissão em Trás-os-Montes, duas mulheres de cara tapada com um véu negro. Uma mãe dá de mamar ao filho sentada num saco de trigo enquanto uma criança vestida de anjo a alumia.

40 filmes
1000 fotografias só da Magnum

O QUE PRECISAM MAIS PARA FAZEREM DA SEDE DA PIDE UM CABRÃO DE UM MUSEU EM VEZ DE UM HOTEL DE LUXO?

Olhem-se ao espelho e sintam vergonha...