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11.10.05

No tempo em que eu queria ser gajo

Ora muito se fala agora dos blogues de gajas e de gajos, na escrita feminina, na visão feminina, blá, blá, blá, e no estrogénio versus testosterona e Vénus e Marte e o raio que parta as ratas (desculpem mas não consigo escrever vagina, nem cona, nem grelo) e as pilas.

Pus-me por isso a lembrar do tempo em que eu queria ser gajo. E isto durou algum tempo.

Eu quando fui para a escola queria ser gajo.
Eu não queria vestir vestidos.
Eu não gostava de brincar com as bonecas.
Eu tinha calças de bombazine e ténis sanjo.
Eu usava o cabelo curto.
Eu andava à porrada e nem sempre perdia.
Eu jogava à bola.
O meu pai não me levava ao futebol.
O meu pai não me levava à pesca.

Eu na escola, já um pouco mais tarde, ao pé das gajas, não podia ser grande gaja.
Eu não tinha mamas.
Eu não usava mini-saias porque os meus joelhos eram mais largos que as coxas.
Eu não andava de mão dada com nenhuma menina.
Eu não tinha uma única e inseparável melhor amiga.
Eu não possuía um diário.
Eu gostava de livros de detectives.
Eu explorava minas.

Eu na escola, mais tarde ainda, não podia ser muito do grupo das gajas.
Porque eu tinha muitos gajos.
Trocava frequentemente de namorado, sendo por isso odiada por muitas gajas, apelidada de certos e determinados nomes, enfim, digamos que não respeitava muito aquela regra dos 3 meses e tal, depois um período de reflexão e só depois um namorado novo. Era mais três semanas sem período de reflexão.
Só tive o período com 15 anos e por isso não podia participar das conversas no balneário, além de que era odiada porque ia sempre ao rio, sem preocupações.
Tinha muito boas notas. Principalmente a matemática e a física e química, o que não é de gaja.
O meu pai não queria deixar-me ir ao acampamento do fim do liceu porque eu não era gajo.
Mas fui. E andei sempre com os gajos nas bubas enquanto as outras gajas andavam a encornar os namorados com outros gajos. Mas sóbrias, bem bronzeadas e ar casto.


Por esta altura já tinha mamas e cú.
Cheguei à faculdade e tinha um bocado ar de gajo.
Falo alto.
Perguntam-me se a minha mãe me pôs bagaço no biberão.
Conto anedotas. Porcas também.

Mas as saias não me dão jeito.
É que preciso de galgar muros e isso.

Os filhos das minhas amigas dão-se melhor comigo do que as filhas das minhas amigas.
E vice-versa.

Tenho uma amiga que diz que eu escrevo como um homem sendo mulher e que ela gosta disso.

Tive um bebé. O que prova que sou gaja. Gostei de estar grávida, o que prova que gosto de ser gaja. Tive problemas por causa disso, o que prova que por vezes ainda gostava de ser gajo. Fui para o ginásio, o que prova que só posso ser gaja. Mas agora encontrei um grupo de gajas que joga à bola, o que prova que, sendo gaja, ainda se pode ser gajo neste mundo!